quinta-feira, 24 de outubro de 2013

alteridadE

A cidade inteira é um arsenal de instigações.

São erguidos monumentos calcários, são moldadas parafernálias de cores férreas, são impregnadas pinturas retilíneas nas paredes e nas placas. Isso tudo vai enchendo a gente assim de questões, de modo que a gente passa mais tempo realocando as imagens anteriores e menos respondendo ao desejo premente das recentes.

Quando mini-mundo se encorpa a este ponto de dar medo de não saber mais onde ele termina, o que é que a gente faz com as coisas que são conhecidas e são ainda assim hiperatraentes? Dá uma vontade bendita de verter a presença das coisas íntimas e amadas em monumentos, parafernálias e pinturas do contra-fluxo da superveniência das coisas surgentes.

E digo mais, a inconveniência do texto é a mesma que a cidade me provoca: um objeto parado num canto da mente, observando os outros flutuarem no entorno, esperando uma colisão.


quinta-feira, 10 de outubro de 2013

cavernA

Desenvolveu-se em mim, repentinamente, uma vontade ardida de saudar o mistério da noite com seus pingos silvestres. As gotas evitavam o meu rosto, como os próprios olhos evitavam enxergar as coisas molhadas do meio da rua. As pupilas dilatavam-se, expulsando a preguiça de viver no banho-maria do sono perdido (e do sonho vencido). Foi na véspera disso que esqueci completamente de me perder nas fissuras do dia, lá quando o sol se enrola no algodão da nuvem cinza e finge que não volta mais. O sol tem o fingir mais mal dissimulado que eu já presenciei, dá pra saber direitinho quando ele não quer conversa alguma, dá pra saber até bem se há algum ensaio de eclipse na minha alma. Porque o sol nunca vai dar conta de ser tão funesto como a noite, porque o sol não sabe se despedir chorando e enxugando o choro com lenço argênteo. A noite é o princípio de qualquer umidade!

[dedicado ao futuro do meu pretérito]